sexta-feira, 27 de junho de 2008

Intento


Se me dedico
a desenhar, desenho
Se me ponho a entoar,

canto


tomo dos instrumentos
faço minhas armas
lido com medos, processos,
segredos


se estruturo em barro,
carvão ou giz
me preservo, me tranco
me abro ou observo


já pintei com lágrimas
saliva, sangue
já esfreguei terra, folhas, sumos
já lavei aquarelas
afim de esquecer


entornei cafés
engoli fumaça
cortei lascas, farpas, pontas
entortei metais


Doí, sarei,
Surtei, perdi,
fui muito longe sem sequer sair
na madrugada, o assombro


na cantiga, doçura
de ninar criança
o protesto rouco
dores e lamentos

corais, botecos
Kirie, blues


"Este baião,
eu inventei pra ninar
o meu amor num berço feito
de raios de luar,
baião, oi, de ninar..."


A voz sai sem esforço
quando a canção pede
no tom conforme
o outro tom


e quando os pássaros
vêm dançar aqui
aí eu bebo o céu
em sua inteireza


Aspiro ao vôo
imito jeitos
transtorno os outros
intenciono ser


Culpa, culpa,
mea culpa,
de sonhar acordada
de gargalhar alto
de chorar à toa
de fazer sozinha
de tentar adivinhar
de ir aonde o vento me levar

agora


A música "Baião de ninar", aprendi com Gisele Cruz, assim como o "Kyrie", herança das missas cantadas em latim. A foto foi feita numa perambulação por São Paulo, em companhia do Cauê. Parece a lateral da matriz da minha cidade...

2 comentários:

Débora Kikuti - contadora de histórias disse...

Fiquei emocionada com a escritura e mais ainda...com a foto! Cê sabia que essa é a Rua do Comércio, aonde ficava o Sindicato dos Bancários (exatamente de onde cês tiraram a foto)???? Lugar em que vivi durante 13 anos de minha vida, com dores, amores, tristeza de coração, solidão de amigos mas muita, muita alegria de alma em fazer teatro no centro velho de Sampa!!! Cresci muitíssimo vivendo nessas ruas, especialmente nessa. Foi lá que vivi mergulhada em meu mundo de curar internamente e lá também re-lembrei a importância da palavra NÃO. Ver esta foto foi uma sensação de saudade, misturada com "ainda bem que passou". Coisa de gente que tem memória, mas que gosta de deixar o que passou lá, no passado.
Brigada querida!

Mary Flower disse...

Puxa, Dedé,
Os lugares têm essa força que nos atrai...estávamos voltando da gráfica onde o Cacau ia imprimir o material do Cláudio... estava fechada, era um sábado, 12h30. O Cau conhece bem esta região, ele fez cursinho ali. Almoçamos no boteco que fica no final da rua, nas mesinhas na calçada que aparecem na foto. Que bom saber que nossa história continua se cruzando...