De acordo
com os cálculos
(cálculos são pedras!)
há conchas
desde os primórdios.
Os tenros moluscos
que as habitam
também.
A casa então
é milenar.
Existe
desde que o mais mole dos seres
se escondeu do predador
e secretou (secretar é um verbo esquisito)
misto de areia e sucos gástricos
e expeliu (expelir é bom)
o misto de si e do meio
que viria a habitar.
Estas são as hipóteses científicas.
No meu ABC, fica assim:
O homem, com inveja, construiu
com barro, excremento e palha
também sua casa
Madeira veio depois
Metal e vidro mais adiante
O plástico, o papelão,
n'algumas moradas hoje.
Dona Doida diz que Deus gosta
de espiar a casa do homem
Seu olhar por cima
da cumeeira do mundo.
O que será que Lhe apraz?
Como o molusco na concha,
nossa imensa solidão?
Ou nossa capacidade
de povoar de mistérios,
de agregar criaturas,
de miniaturizar o universo,
criando para nós mesmos
o que houvera de agradá-Lo?
Sempre pensei no Deus
jogando eterno xadrez
com Aquel'outro.
As partidas se sucedem
ganhando, ora Este ou Aquele.
Então nosso mundo,
possa ser que seja o prêmio:
a casa de bonecas,
todinha mobiliada
e com a gente dentro.
Mas o bom que Eles acham
é jogar!
Dona Doida é a personagem do poema de Adélia Prado que ganhou vida na peça teatral com a atriz Fernanda Montenegro.
Gaston Bachelard escreveu um livro sobre A Poética do Espaço, assim como escreveu sobre a água e o ar...
Desde criança, tenho fascínio por conchas.